Quando beijei pela primeira vez, senti o beijo como se
tivesse surgido uma explosão de fogo-de-artifício que me envolvia e consumia.
As luzes desligaram-se e o tempo parou. O meu corpo libertou calor e luz e eu
soube, pela primeira vez, o poder do beijo.
Depois vieram as dunas. Entre abraços e beijos que queriam
queimar a roupa, provei o sabor de orgasmos partilhados. Contemplei o meu êxtase e o dele, parei para ver olhos cerrados, faces rosadas, e vibrei com aquela
respiração ofegante e ausente própria do chegar ao cume do mundo. E, com
areia na pele, desejava ficar naquele consumar para sempre. Ele chegava de
bicicleta e fazia-me voar até à praia e depois até ao céu.
Escondidos de olhares indiscretos, aprendíamos o corpo um do
outro, decorei sinais e texturas, enquanto a chuva ameaçava surgir e o frio do
fim do dia ameaçava a hora de voltar. E quando voltava, voltava com saudade e
sem gravidade no corpo. Vivia para o próximo beijo, para o próximo toque, para a brisa
marinha, para calor da areia.
Quando me abriu as portas de casa dele, a urgência de
experimentar novos sabores fez frente aos meus medos. Pouco a pouco o desejo me
despiu de pudores. Peça por peça, me mostrava a ti, peça por peça, te achava o
extremo da beleza masculina.
O tempo a passar e a paixão a manter-se no auge, fizeram-me
ceder a propostas tuas. Acordei em deixar-te invadir-me como ninguém antes tinha
feito. Senti a dor, a frustração, as dúvidas. Senti o teu tremor e a nossa
inexperiência com desilusão. Teimosa, dominei-te, sentei-me em cima de ti e
expandi-me para me dares prazer.
Voltamos às montanhas russas. Descobri mais do teu corpo,
mais da tua casa, mais de ti. Descobri muito mais de mim. Entre chocolate,
gelo, vendas e diferentes posições em diferentes compartimentos, iniciei uma odisseia
de desejo que me fazia acordar no dia-a-dia e logo de manhã entreter-me a
escolher uma roupa interior que te seduzisse.
E quando te começaste a afastar, chorei enquanto me
satisfazias, como num luto de prazer. Quando te perdi,
perdi a graça, deixei a minha sensualidade de lado, fantasiei em encontrar-me
contigo e fazer sexo só porque sim, aceitando que não me amasses de volta. Mas
não aceitei, e magoaste-me quando me invadiste sem amor. O teu cheiro
despertava paixão no meu corpo mas a falta de cumplicidade criou raiva em mim.
Chegaste depois para me consular. O teu interesse
divertiu-me. Divertiu-me andares de mão dada comigo. Divertiste-me quando
vestido me invadiste a casa de banho e me agarraste o corpo nu sobre a água
quente do chuveiro. Senti, de novo, desejo, de novo, a rebeldia. Gozei o gostares mais de mim do que eu de ti. Gozei, até me levares para a cama. Aí entraste sem
me ouvir o corpo, que te rejeitava e fingia sem sequer querer parecer
convincente. Sujaste-me, só quis lavar-me e nunca mais te ver. Mesmo assim
foste a minha rampa de lançamento. Desculpa se intencionavas ser mais do que isso.
Quando me abordaste pela primeira vez, provocaste-me pela
inconveniência do contexto. Fruto proibido mais apetecido. E quando te
vi, expuseste o teu lado carinhoso. De início desprezei tanta entrega, e apenas
cedi em jogar. Até as despedidas começarem a custar mais. Até que me perguntas “queres namorar comigo?” quando pensava que estava velha de mais para ouvir
isso. Desfrutei da tua força, ensinei-te o que pude acerca do meu prazer. Gozei
as conquistas e surpreendi-me quando me mostraste ainda mais sensações.
Desiludi quando senti que não vibrávamos com igual frequência mesmo que com a mesma intensidade. Permiti que levássemos tempo a
calibrar as demonstrações de paixão. Como meu porto seguro, ofereceste-me refúgio
que compensaria outros obstáculos. Admirei a tua franqueza, amei a tua falta de
maldade, escolhi-te para ficares.
Em tempos mais conturbados, em que choveu dentro de mim, em
que deixei de fazer amor comigo própria e com o mundo, apareceste tu.
Aparentemente como uma amizade, como festa de sexta à noite. Frente ao perigo, que ignoraste, olhaste-me fixamente. Incomodada senti-te a despir-me com o
olhar. Como poderias? Todas as convenções diziam que não o farias. Depois de
perceber o atrevimento, gostei e fiz não ver sinal de alarme. Podia ser a tua
forma de ser, sendo assim aceite pelos outros. Seguiram-se conversas longas,
brincadeiras e risos. Dei por mim ao teu lado a pensar que queria subir para
cima de ti. Muito suavemente, as piadas passaram a sérias e a verdadeiras
vontades. Desafiaste-me: “beija-me”. E beijei. E quando me apercebi já era
tarde de mais. Reconstruíste-me a sensualidade, e a minha libido fez-me voltar
a sonhar. O proibido deixou-me louca de doçura, ao mesmo tempo que me tirava o
sono por me perturbar a moralidade. Desisti quando te propus seguir o legítimo
e tu te acomodaste ao pedir para manter a loucura assim. Mandei-te para o
caralho. Deixaste me pior do que antes de te conhecer. Fizeste de mim não
mulher mas culpa.
Se te tinha afastado fui à tua procura de novo. Pensei que
pudesse escolher ficar só. Mas senti saudade e vontade do nosso amor. Pedi-te
desculpa em silêncio, chorei a culpa sem ta comunicar. Aceitaste-a silenciada
em mim. Ao mesmo tempo, senti que para te acender a paixão tinha que a afastar.
Deixei-a de lado e fiz-me mulher, tua mulher.
E houveram momentos em que nos sentimos indestrutíveis,
outros como amigos, outros como estranhos, outros como amantes, outros como
animais… e as estações passaram por nós, construindo o que conheço como
relação.
Assumiste também outras faces que voltam e meia me
incendeiam em sonhos eróticos. Que me elevam o ego e alimentam a minha
sexualidade. Percebo que esta se vive durante todo o dia, acompanhada ou
sozinha, contigo ou contigo. Entre fantasias torno me mais desejada mas também
mais feliz e apaixonada por mim e pelo mundo.
Não exponho isto por palavras ditas, não pretendo acabar com
a tua ilusão de exclusividade que não deixas possuir. Vês só o que escolhes
ver. E brincamos às personagens sem grandes riscos e culpas. Diz lá, não me
achas mais bonita, mais atraente assim?
Tens eu me deixar dançar. Tenho que me deixar dançar
contigo. And go where the wind
blows…